quinta-feira, 10 de abril de 2014

De lá até aqui.

Éramos só eu, ela, o céu e o mar mais bonito que a gente já viu. O nítido barulho das ondas quebrando lentamente no mar indicavam que a praia era toda nossa, como as histórias que a gente dividiu até aqui. Aquela quinta-feira, em que a gente acordou num estado e foi descobrir um novo, era a coroação de todas as descobertas que fizemos juntas. Vez em quando uma de nós abria os olhos, levantava a cabeça, fitava aquele mar e quebrava o silêncio perguntando: "olha esse mar! Você acredita que a gente tá aqui?".

Apesar de morarmos do lado uma da outra, a gente precisou atravessar a cidade pra se encontrar. A gente se encontrou pra compartilhar os anos mais desafiadores - e os melhores - de nossas vidas. Ela sou eu morena, eu em outro corpo, um pouco mais alto, bem mais magro,  mas ela não sou eu quando falta um pedaço que precisa ser completo. Ela é a disciplina que eu não tenho, a vontade de levantar todos os dias e cumprir tudo o que é preciso, a determinação que nenhuma nota minha vai alcançar. Apesar disso, tem um tanto de mim nela, tem muito dela em mim. Deus sabia que eu era pequena demais pra carregar toda a angústia que é viver e me deu outro corpo pra guardar um pouco. Dos nosso medos de não chegarmos a sermos o que queremos compartilhados em longas viagens de trens, das pressas divididas entre garfadas na comida sem gosto do bandeijão, das mudanças que vieram parecidas pra nós, sempre em épocas próximas. Das músicas compartilhadas, inclusive aquela da Mallu que tem meu nome e ela sempre canta pra mim, dos sonhos que não cabem no peito, mas cabem numa mochila pra levar pela América do Sul ou no estojo da Mafalda que ela me trouxe da Argentina. Das longas conversas sentadas sobre a grama contaminada da EACH, num ônibus na estrada pra Arraial ou sentadas num banco numa praça lotada em Laranjeiras.

A gente é pequena demais pra esse mundo. A gente tem pressa e compromissos demais. A gente tem medo da nossa resignação a essa rotina. A gente tem angústia do que vai ser de nós e se a gente vai ser mesmo o que a gente sonha. Mas, você acredita que a gente tá aqui?  Só ela seria capaz de entender plenamente o que cada quilômetro andado nessa cidade me ensinou, porque a ensinou também. Você acredita que a gente tá aqui? O tanto que aprendemos, vivemos, crescemos, mudamos. Você acredita que a gente tá aqui? Talvez a gente nem saiba onde "aqui" signifique, onde a gente está de fato ou pra onde estamos indo. Mas a gente tá aqui. A gente. Eu e ela, eu que sou ela, ela que sou eu. 

Sobre amanhã, Deus sabe. O que eu sei é que nós duas estaremos lá, como foi desde nosso início, e uma de nós vai quebrar o silêncio pra dizer: "você acredita que a gente tá aqui?". 

PS: Feliz Aniversário!