quarta-feira, 21 de maio de 2014

Sujeito (in)comum

Você passou no canto direito da rua, fiquei na ponta dos pés pra te ver passar, num esforço significativo já que minhas pernas tremiam involuntariamente. Mas você passou e não era você, mais um alarme falso. 
Seu rosto estava espalhado pelo centro da cidade, da Praça da República ao Vale do Anhangabaú. Tinha você por toda a São João, inclusive eu sentia a mesma coisa que Caetano quando passei por essa na altura da Ipiranga, porque te vi parado, de perfil, um perfil que nem era o seu. 
Vi o cinza usual esparramar-se e senti uma profunda agonia por não saber se a gente dividia aquele céu. Se você via o mesmo cinza que eu, talvez isso ou pelo menos isso, já que você nunca sentiu o mesmo que eu, já que você nunca se pegou procurando meu rosto por aí, como eu fazia com o seu naquele momento.
Notei que seu rosto talvez seja comum, tem muita gente com seus traços por aí. Tem você barbudo, na versão barba feita, tem você bem mais baixo do que nas minhas lembranças ao seu lado. Tem você vestindo cores que eu nunca te vi vestir. 

Notei que tem muito você por aí e ainda tem você por aqui, em mim. Tem você o suficiente pra me fazer ver tanto seu rosto por aí, enquanto abafo essa agonia de que talvez eu não saiba quem você é realmente e só saiba que você não é nenhum desses rostos na multidão que circula por essa cidade cinza.